Quem bebe uma xícara do café “Sá Biquinha” deve saber que naquele pacote há mais do que grãos, do tipo arábica, que atingiram, na safra de 2025, a pontuação de 84,5, com notas sensoriais de caramelo e chocolate. O pacote também carrega histórias, o resgate de memórias e a cafeicultura feminina e familiar.

Cultivado em Oliveira, no Centro-Oeste do estado, a cerca de mil metros de altitude, o “Sá Biquinha” foi idealizado por Renata Aparecida Mattar, de 55 anos, nascida no mesmo município. Ela encontrou nas lavouras da propriedade do marido, Márcio Eugênio Leite de Castro (presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Oliveira), a possibilidade de dar o seu toque e estilo próprio ao que café que já era produzido na fazenda, com área de 55 hectares plantados. Hoje, parte da produção é vendida in natura e parte é beneficiada. E é a Renata quem cuida, de perto, dessa última etapa até o produto ficar pronto para a venda.
História da família
É preciso voltar um pouco no tempo para contar algumas dessas histórias, que foram entrelaçadas e ajudaram a construir o que, hoje, é o café “Sá Biquinha”.
Ainda na infância, Renata morava na cidade e tinha o costume de acompanhar a mãe em passeios até a fazenda do tio. Para chegar até lá - uma distância de aproximadamente de três quilômetros - ela cortava caminho pelo meio de uma fazenda, que anos depois, tornou-se a sua casa. Na época, já era a propriedade da família do Márcio, que só conheceu mais de 20 anos depois, em São Paulo. Eles se casaram, voltaram para Oliveira e se uniram pela melhoria da produção de café da família.
Renata conta que, desde então, passou a ajudar o marido no manejo das lavouras. “Eu não entendia muito, mas me interessei e fiz muitos cursos do Senar, que me ajudaram. Assim, nos finais de semana, acompanhava o meu marido nos tratos da lavoura; depois, passei a sugerir melhorias em terreiros de cimento, novas estratégias de secagem e de armazenamento”, lembra.

Há pouco mais de cinco anos, surgiu outra ideia: oferecer o produto pronto e embalado para o cliente. A iniciativa foi da Renata, que tornou-se responsável por levar os grãos para torra e moagem em uma cidade próxima. Assim nasceu o café “Sá Biquinha”, que ainda é vendido em poucas unidades, mas que vem ganhando a confiança de novos paladares.
Homenagem à 'Sá Biquinha'
O nome escolhido para o café é o de uma das personalidade mais ilustres da história de Oliveira. “Sá Biquinha” era uma mulher negra, descendente de pessoas escravizadas, que viveu até os 102 anos. Ela foi uma moradora conhecida por catar latinhas para fazer os adereços de suas roupas e da casa em que morava. Também era uma figura importante no Congado e no Carnaval de Oliveira.

Segundo moradores, ela tinha dons de prever o futuro. "Quando criança, eu tinha o costume de ir até a casa de 'Sá Biquinha' para pedir para ela ler a minha mão. Em uma dessas conversas inocentes, ela me disse que eu iria morar em um campo cheio de cupins, risos, o que de certa forma, veio a se cumprir”, conta Renata.
Por essas e outras histórias, a produtora rural guarda a lembrança com afeto e escolheu fazer a homenagem à moradora. “Sá Biquinha” ultrapassou os cem anos, mas não conseguiu viver o suficiente para usufruir do legado deixado no município nem para ver o nome dela estampado em uma marca de café.

Carlos Chagas
Outra personalidade que aparece na embalagem do café é Carlos Chagas, também nascido em Oliveira. Foi médico, professor e pesquisador que entrou para a história, motivo pelo qual foi indicado duas vezes ao Prêmio Nobel. Além de conterrâneo, ele é da mesma família do Márcio Eugênio, proprietário da fazenda de café, onde é produzido o “Sá Biquinha”.